Caro leitor,
Imagine
que, em um mesmo dia de sábado, você tem dois compromissos: um
churrasco na hora do almoço, em uma chácara com piscina e, à noite, um
casamento religioso e a recepção em um salão de festas. Você iria com a
mesma roupa nos dois eventos?
As
normas de etiqueta e de decoro (relativo ao comportamento) nos
orientam, juntamente com o bom senso, a não irmos com a mesma roupa a um
churrasco na hora do almoço e a um casamento à noite, pois o primeiro
evento é de caráter informal e o segundo é de caráter formal. Ao
churrasco, podemos ir com roupas informais e do dia a dia, até podemos
levar roupas de banho, pois, no nosso caso, há uma piscina que é sempre
bem vinda. Por outro lado, o casamento requer uma vestimenta formal, no
mínimo um traje esporte fino (dependendo do desejo dos noivos, diga-se
de passagem), pois trata-se de uma cerimônia religiosa (a qual devemos
respeitar, inclusive, na nossas escolhas de roupa) e de uma festa mais
elaborada.
Agora, prezado
leitor, imagine que você, em um mesmo dia, tem uma entrevista de emprego
no fim da tarde e um amigo lhe convidou para ir a um barzinho no início
da noite. Você pode até ir com a mesma roupa em ambos os compromissos,
já que um será em seguida do outro e talvez não haja tempo para passar
em casa, tomar um banho e trocar de roupa (os homens podem tirar a
gravata e as mulheres podem realçar a maquiagem, por exemplo, para irem
ao barzinho), mas em relação a linguagem, você falaria com o
entrevistador do mesmo jeito que conversa com o seu amigo?
A Linguística diz que não. Há duas modalidades de língua, a oral e a escrita
e, em paralelo, há duas variedades: a formal e a informal. Dentro
dessas variedades, há outras mais relacionadas a aspectos geográficos
(urbana e rural), de gênero (homem e mulher e as gírias dos diversos
grupos de representação como gays, transexual, travestis etc), sociais,
econômicos dentre outros.
Assim,
devemos seguir as modalidades e as variedades requeridas pelo contexto
no qual estamos inseridos. Em uma entrevista de emprego, por exemplo,
devemos falar de modo formal, já que estamos conversando com alguém que
está nos avaliando e que, provavelmente, caso a entrevista seja
positiva, será o nosso superior na hierarquia da empresa. Já em um
encontro com amigos em um barzinho, por exemplo, estaremos conversando
com uma pessoa igual a nós, isto é, do mesmo nível e, portanto, podemos
falar de modo informal.
O
mesmo ocorre ao escrevermos. Você escreveria, na mesma variedade
linguística, uma mensagem por e-mail para o seu professor da
universidade e outra mensagem para um amigo? Não. Apesar de ambas
estarem na modalidade escrita, as variedades podem ser diferentes e são,
pois sempre tendemos a nos adequarmos à situação de comunicação.
Em
uma mensagem para o professor da universidade, devemos nos dirigir com
polidez, com respeito, ou seja, de maneira formal; já em uma mensagem
para um amigo, também devemos mostrar respeito, mas podemos fazê-lo com
mais intimidade, carinho e, portanto, de maneira informal.
Esses
exemplos foram postos para fazermos com que você, leitor, reflita
acerca da variedade linguística existente no Brasil e sobre como devemos
nos adequar nas mais diversas situações de comunicação, orais e
escritas, nas quais estamos envolvidos no nosso dia a dia.
Na redação do ENEM 2015,
por se tratar de uma situação avaliativa na qual devemos escrever uma
dissertação-argumentativa, isto é, um tipo textual de caráter escrito e
formal, devemos atentar às regras gramaticais da Língua Portuguesa e
seguir determinados padrões. Não devemos escrever gêneros formais como
escrevemos gêneros informais, para interlocutores íntimos.
Durante a semana passada, o Jornal Hoje,
da rede Globo, exibiu uma série de reportagens a respeito da língua que
falamos no Brasil e tratou, de maneira quase inédita, das variedades
linguísticas brasileiras. O “quase inéditas” deve-se ao fato de haver,
nas reportagens, entrevistas de linguistas como Ataliba Teixeira de
Castilho (professor da USP e UNICAMP) e Rodolfo Ilari (UNICAMP)
explicando que não há certo e errado e sim adequado e inadequado
dependendo do contexto da situação de comunicação no qual estamos
inseridos. Falas de linguistas, normalmente, não são incluídas em
matérias jornalísticas sobre língua e linguagem no nosso país; esperemos
que esse seja o início de uma mudança.
Deste
modo, caro leitor, esperamos que tenhamos contribuído para a sua
reflexão acerca da adequação no momento de falar e escrever.